15 de dez. de 2013

Partir (prosa) - Lady Viana

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Foto por Bleedangel (Bianca BC)

Sentia-se como... se o cômodo estivesse vazio, fosse o que fosse, fizesse o que fizesse. E, no entanto, por que partir? Que diferença, afinal, faria partir? Se a presença era deveras notada por quanto estivesse, tamanha seria a mudança se partisse?
               Mas, novamente, questionava-se, e sua rotina seguia de forma branda e vazia. Procurava, no entanto, alterar de alguma forma o desconforto com novas palavras de carinho e afeto. Não, não mudara coisa alguma – deveras era notada, deveras era... Notada.
               As malas lá estavam, mas vazias – ah, tão vazias! O que botar dentro de um novo destino a partir de um passado enferrujado? E se dissesse o seu nome, uma vez que fosse, seria uma lembrança – e isso, afinal, poderia destruir o futuro. O novo destino, dessa vez, literalmente novo. Encher a mala ou não encher?
               No entanto, o que era isso? O que se passava? O que era ser vazio, era, de fato, não sentir nada – ou seria isso ser insensível? Ou seria isso se acostumar aos sentimentos, tão habituada estivesse a eles? Como diferenciar tal de quanto, não tendo um espelho que falasse, tampouco um humano que respondesse..?
               Oh, triste, triste, ó, triste passado. Chamaria dessa forma, dali em diante. Passado – que assim seja! Pois então, de vazias nada mais – as malas agora lotadas, desajeitadas, tão cheias de roupas mas tão carentes de passado!

               Em breve, pensava, em breve teriam um passado, essas malas. Gostava de pensar assim. Partir. E levar consigo, somente, a esperança de um futuro próximo. Nada mais – o passado que outrora estivera lá só poderia ferir. Era preciso apagar, limpar, purificar, cristalizar... Que venha, pois, o futuro!



Lady Viana 

10 de dez. de 2013

 Há vezes em que...
 Há vezes...
 Há vezes em que não estamos prontos.
 Há vezes que, bem no fundo, bem longe internamente do corpo humano, uma doença se instala.
 Súbita e sem misericórdia, mata-te aos poucos - mas não em emoções, não. Essa mata o órgão, o estômago, o pulmão, o coração e o cérebro. Depois vem a pele, os dentes e o cabelo.
 Nada direi sobre os olhos; são imutáveis por um ano. Passado isso, mudam-se pouco. Por vezes ganham brilho, por outras secam-se...e opacos...
 Mas, voltemos ao arrependimento. Não é de ontem ou de hoje que existe a autopiedade; automassacre; autosuicídio, como se isso já não fosse redundante. Explico: quando mata-te por uma janela ou um revólver, eis o suicídio. Quando cometes um erro, e por menor que seja, mata-te o arrependimento, ah!.. eis o autosuicídio.
 Se não houvesse dito, se não houvesse feito, se... 
 Agora, há vezes que mente-se para si. Maior mentira. Autosuicídio. E que dor é essa! É tão estranha que quase traz felicidade. É tão irrevogável que sempre precisa-se de mais. É tão insaciável, sempre tão faminta, viciante. Perturbadora.
 Quando tentas confiar nas tuas próprias palavras, mas enojeia-te a ti mesmo para olhar no espelho. Quando teu ódio por ti é tamanho, que te impede de amar - o teu próprio eu! Não conseguir acreditar no que diz, tuas próprias palavras! E de olhar no céu escuro e temer a morte - não pelo que perderá, e sim do que está por vir.


Lady Viana



9 de dez. de 2013

Partir - Lady Viana

Partir, e
só partir.
Nunca mais me iludir.
Ah, maldito bucolismo
Cheio de achismos.
Partir, simplesmente partir
Sem ter para onde ir.
Partir...
Ah, meu amor, partir, sim!
Sinto que sentirei...
Para sempre amarei.
Mas, não mais.
Não mais.
Partir..
Partirei.



Lady Viana


4 de dez. de 2013

Romaria, Romaria - Lady Viana

Ó, Romaria, Romaria!
E no teu círio, ouviam-se...
O transpirar dos grandes sinos.
Vede teus romeiros.

E lá caminham homens
dos pés do sertão.
Assim como mulheres
com crianças nas mãos.
Perdão!
Em teus caminhos de lírios...
Martírio. 
Delírio!..
Perdão!..

E lá caminham homens
pela estrada da ilusão.
Assim como mulheres
pisando duro o seco chão.

À noite ouvi teu canto.
Apago a luz...
Santo Deus...
Perdão!
Perdoa essa alma
pequena, simplória,
Mas de grande Coração.



Lady Viana